Todos os Caminhos Conduzem a Deus

Caminho 

No plano espiritual, contam que um

homem, imbuído de profundo

sentimento religioso, decidiu-se a

procurar o caminho mais curto de

chegar ao céu.

Depois de muito pensar sobre o que

deveria fazer e estudar profundamente

os compêndios religiosos mais

importantes da época, decidiu-se a

cuidar exclusivamente da sua salvação.

Entretanto, possuía família: esposa e

três filhos, que lhe tomavam todo o

tempo disponível, pois precisava

trabalhar arduamente para mantê-los.

Meditando que Deus alimenta seus

filhos e que Jesus ensinara que os

pássaros do céu não trabalham nem

amontoam em celeiros, resolveu afastar-
se do lar a fim de dedicar-se

exclusivamente ao seu aperfeiçoamento

espiritual.

Surdo às rogativas da esposa aflita,

cujos filhos ainda pequenos impediam

de trabalhar, um dia juntou seus

pertences, e alegando à mulher chorosa

que Jesus ensinara que cada um deve

segui-lo incondicionalmente, sem

prender-se aos preconceitos de família,

saiu de casa em busca da perfeição.

Caminhou em procura incessante

durante longos anos, dedicando-se ao

culto puro da religião, em contato com a

solidão dos bosques e florestas ou

isolado em templos, onde buscava a

ligação através da oração com a

divindade.

Fugia ao contato com os demais por

achar que estava já acima do nível

comum. Possuía no corpo a leveza dos

constantes jejuns, mas o espírito ainda

buscava incessantemente a paz e a

serenidade almejadas.

O tempo foi passando, seu corpo

envelhecendo, seus cabelos ficando

brancos e as pernas cansadas, porém,

ainda seu espírito procurava a ligação

sonhada com a divindade. Embora com

a mesma disposição anterior, a solidão

já começava a pesar-lhe, e as saudades

do lar enchiam-lhe o coração de

profunda melancolia.

“O que terá sido feito dos meus?",

pensava muitas vezes.

Acreditando-se joguete da fraqueza,

reagia, buscando fugir à depressão.

Com o tempo, sua sensibilidade

emotiva o fazia ter visões, onde sempre

era o objeto central, e nelas via-se

recebendo o prêmio de sua vida

sacrificial de repúdio às paixões carnais

comuns à humanidade.

Então, pensava ele, ajudaria a família,

a esposa muito ignorante, que não

conseguira compreender a

superioridade das suas atitudes.

Quando a moléstia o acometeu, só e

triste, não gozou do conforto acolhedor

de carinho familiar e em triste situação

de abandono sofreu penosa agonia.

Desencarnou.

Ao despertar no plano espiritual,

admirou-se com a tristeza da paisagem.

Em zona ressequida e árida, onde o

verde não existia, erguia-se grande

templo cinzelado de ouro e pedras

preciosas. Nosso amigo penetrou em

seu interior e verificou que, apesar da

riqueza da sua decoração, ali não existia

calor, e tudo era extremamente

inexpressivo. A um canto, longe um

pouco do altar ricamente adornado,

enorme biblioteca atraiu-lhe atenção, e

com espanto, aproximando-se,

reconheceu todas as obras que lera

durante todos aqueles anos.

A primeira impressão foi de alegria,

mas, depois, a solidão começou a

incomodá-lo. Sabia que tinha passado

pela morte, entretanto, onde a

recompensa pela sua imensa luta?

O desassossego aumentava à medida

que o tempo passava, e ele não

conseguia sair do templo, apesar da

vontade que tinha de fazê-lo.

Vozes começaram a escarnecê-lo, e

ele não conseguia identificá-las. Diziam-
lhe:

- Tu não quer ser santo? Não querias

saber tudo? Aí tens, pois, o teu ideal

convertido em realidade. Convém reler

os teus livros. Pode ser que eles te

revelem a maneira de saíres desta

situação...

E a pobre criatura, para vencer o

tédio e preservar a sanidade mental,

começou então a reler os livros que

dantes estudara.

Porém, com singular

desapontamento, ao reler o Evangelho

do Senhor notou que os caracteres já lhe

pareciam diferentes, e começou então a

duvidar, pela primeira vez, da eficácia da

sua interpretação passada.

Dúvidas terríveis insuflaram-se em

seu íntimo, e com lágrimas descendo

pelas faces, não suportando mais o peso

das suas resoluções passadas, orou ao

Senhor implorando auxílio.

Atendido por entidades superiores,

foi levado para uma sala repleta de

anciãos respeitáveis, para expor suas

necessidades.

Nosso amigo, em lágrimas copiosas,

expôs seu caso e concluiu:

- Sinto que não andei bem quanto à

minha maneira de agir na Terra. Pensei

somente em minha salvação, sem me

preocupar com os meus. Agora sei que

esse dever eu não cumpri, e desejaria

ajudá-los de alguma forma para poder

sentir-me em paz.

O venerável ancião, olhando-o

sereno, respondeu:

- Não há, por agora, necessidade de

preocupação. Vossa esposa já está aqui

e virá falar-vos.

Admirado, ansioso, nosso amigo

aguardou a presença da companheira.

Entretanto, inesperado jato de luz

impediu-o de enxergar bem a criatura

que se manifestava entre eles. Auxiliado

por companheiros, aos poucos

conseguiu acostumar-se à claridade e

pôde perceber que a entidade como que

se apagava para que ele pudesse vê-la.

Estupefato, reconheceu naquela

criatura radiosa e belíssima a figura

humilde e simples da esposa.

Lágrimas emotivas corriam-lhe pelas

faces e as palavras morreram-lhe na

garganta.

O belo espírito aproximou-se e

carinhosamente acariciou-lhe os cabelos

encanecidos. Mudos permaneceram

envoltos por emoções intraduzíveis.

O ancião, tomando a palavra

explicou:

- Meu amigo. A maior conquista do

espírito consiste em bem desempenhar

na Terra a tarefa que por Deus lhe foi

confiada. Enquanto teu espírito,

alimentando ilusões, perdia-se no

fanatismo religioso, na modificação dos

textos Evangélicos, adaptando-os às

tuas imperfeições, sem humildade para

compreendê-los, abandonaste a família

ao abandono,fugindo às obrigações

mais prementes, negligenciando o

burilamento dos teus sentimentos,

negando-te a aprender na

heterogeneidade do mundo a lição de

fraternidade do Senhor. Enquanto isso,

tua mulher lutava sozinha na dura lição

terrena para conseguir o sustento dos

filhos que abandonaste, e embora lhe

faltasse o tempo para leitura brilhante,

teve ocasião de exemplificar no trabalho

e na honradez, na tolerância e na

bondade, na disciplina rígida a que se

impôs pela necessidade, conseguindo

educar os filhos na moral mais pura e no

conceito mais elevado, encaminhando-
os seguramente na senda da vida. E, se

às vezes, quando a luta se exacerbava,

procurava algumas linhas do Evangelho,

encontrava nelas alimento e conforto,

renovação e luz, porque as podia

compreender na grandeza da sua

simplicidade. Os sofrimentos dos seus,

suas lutas, deram-lhe a noção exata da

alheia necessidade. Assim, ajudou o

quanto pôde, não com recursos

financeiros, que nunca possuiu, mas

com suas mãos doloridas e calejadas

pelo trabalho difícil e rude de cada dia.

Olhando o espírito confuso e triste,

que cabisbaixo não ousava interromper,

continuou:

- Unidos na Terra, em vida pobre e

difícil, tiveram ambos a oportunidade de

avançar na conquista da evolução.

Escolheste o caminho mais difícil, estéril

e longo; ela soube encontrar o caminho

mais curto e proveitoso. Por isso, é

imprescindível que retornes à Terra.

Sozinho, agora com os conhecimentos

didáticos adormecidos, serás analfabeto

e trabalharás duramente para conseguir

sustento. Aprenderás, assim, a lição da

humildade, e talvez um dia chegues à

altura da tua companheira em planos

mais altos.

E rematou, notando a profunda

tristeza de nosso amigo:

- Entretanto, aprende que, embora 

com maiores sofrimentos, todos os 

caminhos conduzem a Deus.”

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